15 março 2006

Dois em Um – Estar grávida

Ter cá dentro um ser. Senti-lo mexer. Pensar na cor do cabelo, no rosto, no sorriso, na voz, na personalidade. Pensar se vamos estar à altura. Esquecer as medidas correctas. É a única vez na vida que se anseia por uma barriga visível: espetar orgulhosamente a barriga! E depois, no médico, ouvir o coração, perceber que aquilo que aparece no écran é uma mão, um pé, o rosto: vai ter o meu nariz.
Estar grávida. É falar literalmente para o umbigo (e saber que tudo gira à volta dele). É ser vista pelas outras mães com outros olhos, com outras palavras. É ouvir milhentas vezes: que venha com saúde e que seja uma hora pequena. É as outras mães darem a senha de entrada para um clube restrito.
Estar grávida é perceber o que só as mães sabem. Mesmo as que o são sem nunca engravidarem. Estar grávida é um estado de alma que se pode traduzir (ou não) num estado do corpo.
Estar grávida é querer desfrutar cada momento, cada segundo e, ao mesmo tempo, ansiar pelo fim, que será sempre o início. É ser dois em um, ou melhor, é estar dois em um, esperando ansiosamente até ao dia em que seremos finalmente dois. Para depois termos outras esperanças.


Não, não estou grávida. Este é um texto recuperado de há uns tempos atrás feito a pedido de um amigo/primo/pintor

09 março 2006

um dia

acordei e lembrei-me de ti. Das nossas coisas. Do nosso passado.
Um dia acordei e vi que envelheci
Um dia como os outros
Com as nuvens que já não são as nossas.
Mas que agora são as minhas.
Há dias carregados delas
E dias sem nenhuma
e dias que são noites
e tantas noites que foram dias
Um dia acordei e lembrei-me de ti
de todas as injustiças que cometi
de toda a compreensão que não tive
Das desculpas que não pedi
Um dia acordei e lembrei-me
que só percebi tudo isto
agora que também tenho uma filha